Cheguei a casa e ao vê-la
atirei-lhe um “Olá Amor, hoje chegaste cedo”, ao que ela me responde com um “Sim,
cheguei”, polido, educado e um tanto ou quanto frio. E sem me olhar uma
única vez, desapareceu na cozinha.
Estava ainda a tirar as
coisas dos bolsos, preparando para a cumprimentar devidamente, quando ouço a
sua voz sem a ver “Olha, senta-te que temos de falar”. Mais uma vez aquela voz
polida, educada, um tanto ou quanto fria.
Dizem que os homens não são
sensitivos. Concordo com essa afirmação. Pelo menos não são como as mulheres.
Os homens desenvolvem-se sem se preocuparem com a minucia das expressões
faciais, corporais e vocais.
Mas mesmo o mais empedernido
dos homens sabe o que pode querer dizer a expressão “Temos de falar” da boca
de uma mulher. Ou pelo menos tem a obrigação de saber.
Sabem aquele sentimento que
nos impede de “obedecer” ao que os
outros nos dizem, quando achamos que algo está mal? Foi o que me aconteceu.
Fiquei em pé, de braços cruzados, à espera.
Ela veio para a sala. Um
pouco ansiosa. Disse-me gentilmente para me sentar, e quase estalou a fina
superfície de um fraco verniz que trazia por cima de si quando me recusei. Vi
que tinha toda a conversa pensada e treinada, inclusive onde estaríamos
sentados.
Por momentos senti-me um “puto
reguila”, mas já que tomei essa posição, mais valia mantê-la. Ceder
seria pior, agora.
“Como sabes, estamos juntos há
cinco anos”, começou ela, num tom que já parecia de retrospectiva, “e
deixámos as coisas arrastarem-se tempo demasiado…”.
De súbito, compreendi onde
ela queria chegar com esta conversa tão solene! Que estamos juntos há tanto
tempo que e nunca mais marcámos a data do casamento.
Era óbvio. Sempre nos
quisemos casar, mas por alguma razão nunca mais nos decidimos. E há algum tempo
deixámos de tocar no assunto. Sei que na última vez fui eu que toquei no
assunto. E lembro-me que ela fugiu ao tema….
Os meus olhos começaram a
brilhar e os meus braços começaram a descruzar-se para falar e dizer que
marcamos já a data, quando ela, compreendendo que eu não estava a compreender
nada, disse num tom apressado:
- Ivo, eu já não te amo!
(continua)
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