Não imaginava nada do que ela falava, pois eu
só via aqueles lábios a mexerem e aqueles lábios mexiam comigo. E comecei
logo a vê-la com outros olhos, a imaginá-la na minha vida, e a assumir cada vez
maior importância.
Eu continuava a dizer que sim com a cabeça, como se
fosse um boneco de mola, pois já estava noutra dimensão, apaixonado, mesmo
sem lhe ter ouvido a voz. E se a minha cabeça dizia que
sim, a minha alma, também.
Sim, eu sei. Agora sei. Sou “parvo até à quinta
casa” e mais além, se fosse possível. Mas se isso era pouco, devo
acrescentar ainda mais pormenores a esta história, que agora me parece surreal.
Na única ocasião que tive pedi-lhe o número de
telemóvel. Mas ela fez melhor pois apenas pediu o meu (não deu o número dela, mas isso
nem sequer notei). E. levitando, pedi-lhe o cartão do bar e paguei-lhe a despesa. Isto estava a evoluir bem, na perspectiva dos dois.
Claro que a Sandra não me ligou nos dias seguintes, mas eu não perdi a
esperança. Assim, o meu elo de contacto para com a Susana passou a ser a sua
amiga, Graça, e passei a ser ainda mais amigo do meu amigo P., pois sem ele passaria
a estar perdido no mundo, pois nunca mais encontraria a Sandra.
E como fiquei animado quando soube que o P e a Graça se iam encontrar, no mesmo bar, e que ela ia levar a Sandra e o P me ia levar. Parecia
que eles iam levar os cachorros a passear, mas eu não me importei. Não me
importei mesmo nada.
Nessa altura, como bom cachorrinho, já tinha “fuçado”
o Face do P à procura da Graça e o da Graça à procura da Sandra. Bem podia
procurar, pois, soube depois, a Sandra tinha posto o seu segundo nome e com uma
fotografia de quando era criança. Não achei estranho.
Claro que não se acha estranho a nada quando se é tão
burro como eu. Essa noite foi fantástica, pois declarei o meu amor
incondicional à Sandra, ao que ela me disse ao ouvido “Olha, não percebi
nada do que disseste. Vou à casa de banho. Toma conta da minha bebida”.
Os nossos progressos como casal foram fantásticos. Após mais umas
saídas a quatro, e enquanto o P e a Graça falavam no futuro, eu consegui que
a Sandra me ligasse para o telemóvel para poder ficar com o número dela. E nem
queria acreditar na minha sorte!
A partir daí, fomos os dois jantar fora inúmeras vezes. Ela
recusava-se a ir a minha casa, e eu também nunca fui a casa dela. E nem sequer
podia saber onde era. Achava eu que tínhamos começado a namorar, mas era um bocado estranho,
pois perante os meus olhos e de quem nos visse, não havia nenhum indício disso.
Desde o início que me senti um bocadinho posto de parte,
especialmente no mundo virtual, pois ela postava apenas fotos das suas saídas (sem mim, claro) no Facebook e no Instagram, especialmente com os seus amigos manhosos. De mim não havia o mínimo vestígio.
Quando falava com a Sandra acerca de nós, invariavelmente ela dizia
que “Depois se vê, e agora deixa-me sossegada”, e voltava às mensagens e
a rir-se sozinha. Mas eu estava cada vez mais caidinho por ela.
De repente, tudo mudou, pois a Sandra começou a ver-me com outros olhos porque os seus olhos
viram-me com outra mulher. Era apenas a minha vizinha de baixo, que por acaso nos cruzámos na Av. de Roma, mas que para a Sandra passou a ser uma ameaça grave aos seus planos. Eu nem imaginava que ela tinha alguns....
A partir desse momento as coisas entre nós partiram para
outro nível, e começámos a namorar mesmo a sério. Eu fiquei ainda mais entusiasmado,
mesmo sem saber a razão de tamanha reviravolta. Só soube muito tempo depois, como é habitual na minha vida.
Se eu e a Sandra não tivemos nenhum futuro sério foi porque ela não
quis. Ela dizia sempre que sabia que eu gostava muito dela, mas que ela não era
mulher para casar e ter filhos, que gostava era de boa vida, de ter a sua
liberdade, de sair sem dar satisfações a ninguém. Vocês sabem.
Devem estar a pensar “Coitado,
tanto investimento passional para nada”. No
fundo compreendi o que ela queria, e como gostava dela, fiz-lhe a vontade. Fiz-lhe mesmo todas as vontades. Até ao mínimo e ínfimo
pormenor.
Bem, e rematando a história para não vos maçar mais, acabei por casar com a Graça e temos dois filhos, o Luís e a Filomena. E mais feliz não posso estar, pois
tenho tudo o que sempre quis ter. Amor
e estabilidade emocional.
Eu e o P continuamos a ser muito amigos, sendo ele visita muito assidua de minha casa, e inclusive é o padrinho do Luís. Nós escolhemo-lo por eles os dois serem muito
parecidos fisicamente. Mesmo muito, e até me meter impressão. Estranhamente, a Graça não os acha nada parecidos.
E eu? Eu continuo a andar com a Sandra. E com a vizinha de baixo também, pelo menos até a Graça me desmascarar a sério e "pôr-me os
patins", tal como fizeram todas as anteriores.
Ao contar-vos esta história fiquei seriamente desconfiado que é por eu ser assim que as
mulheres da minha vida me deixaram sempre pendurado….
Estas mulheres são mesmo umas desgraçadas sem coração!!!