E o André, sem dizer uma única palavra, disse tudo. E sem dizer uma única palavra levantou-se, saiu
e nunca mais o vimos.
De
repente compreendi que era isso. O porco do Ivo estava a fazer exactamente o mesmo jogo que fez o André. E tantos e tantas fizeram ao longo dos incontáveis séculos!
Era comigo que o Ivo fingia. Eu era o engodo, o seu passatempo. Continuava a amar incondicionalmente a Sónia, mas há falta do melhor, demonstrava gostar de mim! Que grande otária estava a ser.
Era comigo que o Ivo fingia. Eu era o engodo, o seu passatempo. Continuava a amar incondicionalmente a Sónia, mas há falta do melhor, demonstrava gostar de mim! Que grande otária estava a ser.
Senti o chão ali mesmo a fugir-me debaixo dos pés. Nesse instante vi que o tinha perdido.
Mas será que se pode perder quem nunca se teve?
Mas a verdadeira questão era: importava-me? E a resposta veio rápida: sim, importava-me. E muito! Mas no fundo o que é que eu podia
fazer? Nada. Absoluta e rigorosamente nada. Restava-me assistir ao resto da encenação como uma mera
espectadora, não como actriz.
Nesse exacto momento o Ivo remexeu-se na sua cadeira, e percebi a analogia. Vocês sabem: quanto mais a mosca
se debate na teia mais presa fica. E a aranha sabe que se aproxima o momento fatal.
A mudança de comportamento do Ivo foi tão notória que até me deu
pena. Quando estávamos os quatro, ele estava tão tenso como uma corda esticada
num violino, e nem se incomodava de disfarçar que estava com uns ciumes incríveis, não me dando quase nenhuma atenção. E sem notar que estava a ter esse comportamento. Ou sem se importar......
Ao ver o André sair, Ivo relaxou, mas apenas por uns poucos segundos.
Nem ele nem eu esperávamos pela fantástica jogada de mestre da Sónia…que, soube
depois, estava de conluio com o José, o tipo que tinha telefonado para o André!
A Sónia levantou-se de supetão, nitidamente a fingir que ia a correr atrás do André, e acto
contínuo, o Ivo levanta-se e agarrando-lhe o pulso, diz num tom alto e
impositivo “Mas o que é vais fazer? Nem penses. Ficas aqui! Comigo!
Ouviste?” E levantando os olhos, fita-me.
O jogo de olhares entre nós os três foi brutalmente esclarecedor.
A Sónia sorriu levemente. O jogo estava terminado. E ela tinha ganho!
Ao ver que a Sónia tinha desistido de ir atrás do André, Ivo larga-a, e deita-se
no sofá. Entre lágrimas que desamparadas lhe escorriam cara abaixo, olha para o tecto como se estivesse a fitar um
céu estrelado, e diz:
“Só o ciúme me conseguiu dizer o quanto te amo, Sónia, e o
quanto estava enganado acerca de outros sentimentos.” E ao dizer isto
levanta-se e fecha-se no quarto, saindo da sala, saindo da minha vida….
O silêncio que caiu na sala foi insuportavelmente pesado.
A noite começara com um alegre jantar de casais, e no fim ficámos
as duas, apenas as duas, e sem sequer nos olharmos….
Sem aguentar mais, aproximei-me da cara de Sónia e disse-lhe:
“Grandessíssima cabra, manipulaste tudo e todos. E o mais estúpido é que não te impedi. Até
te ajudei!” continuei, já num tom que mais parecia um grito de revolta.
“O Ivo foi e sempre será um pobre desgraçado debaixo das
tuas garras imundas! E o pior é que queres ficar com ele por se ter ousado aproximado
de mim, e só lhe irás infernizar eternamente a vida!”
E a Sónia, voltando-me as costas de forma a que não lhe pudesse
ver os olhos a brilhar com a mais pura das malícias, disse....
"Eu sei…… Mas nós as duas sabemos
bem que é disso que ele mais gosta...."
"Eu sei", disse-lhe baixinho. "Eu sei...."
fim
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