O barulho
das ondas a quebrarem, pesadamente, na praia, torna-se cada vez menos presente,
enquanto o ruído dos meus pensamentos me enche a cabeça, até não
saber, sequer, se é noite ou dia, se chove ou se faz sol, ou se as gaivotas,
afoitas, já estão em cima de mim, em busca de qualquer resto de comida.
Os
pensamentos tomam-me definitivamente de assalto e eu quebro, como as ondas. Por
momentos ainda tento resistir, voltar atrás, concentrar-me na idílica visão do
pôr-do-sol, sonhar acordado, mas tal já não me é possível. Estou perdido nas minhas
dúvidas.
Como é que
isto tudo aconteceu? Como é que a minha vida ficou assim? Como é que não dei por
isso? Porque é que ninguém me alertou? Como me deixei transformar naquilo que
mais temia vir a ser? Porque
é que as coisas boas acabam assim?
As perguntas
sucedem-se a um ritmo tal que não me deixam raciocinar, responder, argumentar,
defender-me. Sou acusado por mim mesmo
num tribunal que não admite defesa nem recurso. E as penas são todas cruéis,
sendo a mais leve o degredo.
Sei que choro
por dentro mas não tenho a certeza se choro por fora. Mas dane-se se quem me esteja
a ver e que não goste de ver um homem feito nesses propósitos. Eu só choro com razão, e por fortes sentimentos. É que se não sabem ficam a saber, que mesmo homens feitos têm
sentimentos. E choram.
Por ela estou
a chorar pela segunda vez. E em ambas, pela ideia de a perder. Mas como tudo
mudou. Na primeira vez chorei porque a ia perder, por sua decisão. E hoje choro
porque a vou perder, mas por minha única e exclusiva vontade.
Se o sentimento
mudou foi para ficar ainda mais forte, mais robusto, mais interligado. Mas, infelizmente
só isso não chega. É preciso mais do que sentimentos. E sei agora que esse mais não está ao
alcance de todos, só de alguns. Talvez esses tenham apenas mais sorte. Ou apenas
mais bom senso.
Quantos têm
sentimentos um pelo outro e não estão juntos? Serão tantos como aqueles que
estão juntos e não têm sentimentos um pelo outro? A vida é injusta para com o Amor, pois muitas vezes junta quem não se
quer, e afasta quem se quer.
Lentamente afasto
a bruma dos meus pensamentos, das decisões e indecisões, dos sentimentos, das emoções,
das relações, das gaivotas, da luz e da escuridão das almas, das questões, dos íntimos
tribunais, das suas e penas e dos degredos.
Regresso a mim, como num longo acordar, e abrindo os
olhos vejo o sol a renascer. Tal como eu….
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